Dissertação de Mestrado - Filipe Salles - 24/06/2002


4.1. A natureza da Imagem

A imagem é produto de um estímulo luminoso aos nossos órgãos visuais, os olhos. Aquilo que 'vemos' é, na realidade, uma imagem formada no cérebro a partir deste estímulo, sendo o órgão cerebral, portanto, responsável pela interpretação do estímulo que nos chega.

Assim, não podemos deixar de mencionar que, ao se tratar a instância imagem, quer seja ela representação estética, quer seja qualquer objeto tridimensional, partindo do objeto em si, é tratar de uma maneira invariavelmente parcial e incompleta, mesmo que se determine com exatidão o limite da observação. Isso porque não conhecemos os objetos em sua totalidade, e sim segundo o 'filtro' visual que é nosso próprio olho, que consegue detectar apenas uma ínfima gama de vibrações do espectro eletromagnético.

Começamos então gerando um grande problema: como tratar cientificamente a instância imagem levando-se em conta que sabemos ser nossa observação a respeito delas absolutamente parcial? Por enquanto, não temos outra saída senão admitir a relatividade extrema de nossas observações e agirmos com prudência ao realizar colocações. Por este motivo, muitas das conclusões aqui alcançadas terão um alto grau de teor especulativo, natural quando se trata de questões tão subjetivas e com tantas variáveis.

Podemos partir, entretanto, de determinados pressupostos: a imagem estética que se nos apresenta sem dúvida possui instâncias sensíveis muito mais abrangentes que o simples estímulo visual. Com isso quero dizer que quando observamos uma obra de arte, o estímulo visual é na verdade uma pequena parte de um processo, uma fonte de conhecimento que sem dúvida pertence a uma grande e intrincada 'teia' de informações, cujas relações se estabelecem mentalmente no espectador. Em segundo lugar, embora limitada, a percepção visual é uma percepção vibratória, tal qual o som, e faz parte do mesmo paradigma, não obstante sua natureza eletromagnética mais ampla.

Assim, a percepção de formas e cores (imagens) está intimamente associada à luz. A própria fotografia demonstra isso em sua nomenclatura, sendo literalmente foto+grafia, 'escrita da luz'. Não apenas porque através da luz que os objetos se fazem visíveis, mas também porque a luz que incide sobre um objeto influi diretamente na maneira como percebemos este objeto. Temos por costume considerar a luz solar como padrão de todo o mundo visual, pois ela nos permite ver as coisas de maneira mais distinta e clara. Porém, se vivêssemos num ambiente cuja luz solar fosse extremamente avermelhada, nosso padrão seria muito diferente, pois consideraríamos neutros os tons vermelhos, e uma série de freqüências visuais não poderiam ser por nós captada. Isso é importante para sempre nos lembrarmos da relatividade da percepção.

Em termos físicos, a maneira mais simples de definir esta instância é considerar a unidade de freqüência, o Hertz (ciclos por segundo). A luz também é medida por essa unidade, e o número de vibrações da onda luminosa por segundo (a freqüência em Hertz) determina a tonalidade da luz, ou seja, sua cor. Já a amplitude da onda se traduz na intensidade dessa luz.

É particularmente interessante notar alguns aspectos referentes à cor segundo sua natureza eletromagnética: primeiramente, a diferença de intensidade de uma cor, por mais que seja a mesma freqüência é interpretada como uma nuance diferente da cor, e não como a mesma cor. Além disso, a combinação de duas ou mais cores tendem a misturar-se sem que se possa definir exatamente as cores componentes a partir de seu resultado final. Isso é verificável quando analisamos os 'harmônicos' luminosos. Eles são formados da sobreposição irregular de freqüências distintas de luz, somando-se a uma resultante. Quase a totalidade das fontes de luz existentes são formadas por sobreposição de freqüências, com exceção do raio laser, luz coerente, ordenada e monocromática.

Foi justamente a partir destas constatações que alguns cientistas, ainda no séc. XIX, desenvolveram as primeiras teorias sobre a percepção cromática. Primeiramente, Thomas Young, que, em 1801, propôs a primeira versão de uma teoria tricromática da visão, ou seja, percepção cerebral a partir de 3 cores fundamentais, Vermelho, Verde e Azul.

Mais tarde, Hermann von Helmholtz aperfeiçoou esta teoria, mantendo a posição de que o olho possuía 3 fotorreceptores, um para cada cor, que se sobrepunham e eram então interpretadas pelo cérebro. Concomitante às proposições de Helmholtz, Ewald Hering propôs uma teoria mais complexa, baseada em 3 combinações cromáticas (Azul/Amarelo, Verde/Vermelho, Preto/Branco), mas inovando em dois aspectos: primeiro, considerando que os fotorreceptores dos olhos são monocromáticos, e que a percepção das cores é uma interpretação cerebral. Segundo, ao estudar diversos casos de cegueira cromática, chegou à conclusão que a percepção das cores possuía uma dimensão psicológica muito maior do que se imaginava.

Apesar de parecerem contraditórias, as teorias cromáticas de Young-Helmholtz e Hering se complementam, pois a primeira se baseia na síntese aditiva e a segunda na síntese subtrativa (cf. Mueller & Rudolph, 1968). De qualquer maneira, ambos os sistemas são, na prática, extremamente importantes: o RGB (red, green, blue, da teoria tricromática) serve como base, desde o princípio até hoje, do vídeo composto, que permite a televisão colorida. É também o princípio do Technicolor, o primeiro sistema comercial de cinema em cores. Já o sistema subtrativo, que utiliza o princípio de complementariedade enunciado por Hering, é fundamental na indústria gráfica e na filtragem e fabricação de filmes coloridos para fotografia.


copyright©2002 Filipe Salles

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