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Alegorias (2022, Leonel Costa) - 11ª Mostra Tiradentes-SP

Alegorias (2022, Leonel Costa) - 11ª Mostra Tiradentes-SP

por Felipe Palmieri

 

A realização do filme Alegorias, assinada por Leonel Costa, se justifica muito mais na fruição de um cinema coletivo. Isto é, o senso de conjunto permeia cada canto da experiência do filme - desde a produção ao resultado final. Sua participação na Mostra Tiradentes-SP é auto evidente, sendo uma adição muito pertinente à ideia de cinema de mutirão que norteou a escolha dos filmes.

 

Tendo sido apresentado como parte do dia de encerramento da mostra, Alegorias narra algumas histórias em paralelo - que acabam por se comportar como o próprio título do filme sugere. A mais relevante é a de duas empregadas domésticas que trabalham para um rico herdeiro em um apartamento de luxo. Logo se entende a dinâmica dessa casa: um chefe abusivo, egocêntrico e que se sente no direito de agir como bem quiser. Francisca e Tamiris são mulheres negras, que sempre viveram em uma realidade distante do patrão Reinaldo.

 

Ambas acabam por representar aspectos divergentes do filme: Francisca é estudante, e se dedica ao estudo da história do samba. Tamiris é de uma família de trabalhadoras domésticas, e apenas segue o rumo, sem contestar sua condição de existência. Dessa forma, abrem-se duas vertentes temáticas que são exploradas em conjunto pela obra: o aspecto cultural e o aspecto social da existência em comunidades negras e de baixa renda.

 

Do ponto de vista cultural, tem-se o conflito de Reinaldo tentando sabotar o Carnaval de rua, enquanto o núcleo de protagonistas aproveita tanto celebrações de rua quanto o grande desfile anual no Sambódromo. É uma disposição no roteiro que ilustra com bastante clareza - talvez até demais - a contradição entre a cultura popular brasileira e as classes mais ricas, que tentam ao máximo se distanciar disso.

 

Observando o filme como um todo, a presença do samba e do carnaval não pode ser menosprezada, pois é onde reside a alma do projeto. Inicia-se o filme com uma sequência extensa de uma roda de samba na rua. A partir disso, vários pensamentos são concretizados através de cenas específicas, como o caso da hipótese de um carnaval em meio à pandemia, no qual há um desfile em uma rua vazia, com apenas um homem percorrendo o trajeto. As manifestações da música são o que guiam um outro eixo narrativo: de expor a história apagada e a memória da comunidade negra de São Paulo.

 

Desviando-se em um certo momento para o documental, o filme nos apresenta à escola de samba Unidos do Peruche, e ao “Seu Carlão do Peruche”, uma figura histórica na comunidade e que é entrevistado como parte da pesquisa de Francisca. A essência do projeto se resume nessa ousadia, de quebrar com o convencional em prol da temática.

 

Percebe-se então como a linguagem é bastante híbrida, não apenas pela interpolação de momentos documentais e momentos de pura ficção, mas também na mudança constante de estéticas. Planos fixos, câmera na mão, uso de drones ou entrevistas: Alegorias parece que termina e recomeça na transição de cena a cena, sem uma unidade estética coerente. Porém, são resultados que fazem parte do processo de um filme realizado em mutirão, como foi dito pelo próprio diretor antes da sessão no CineSesc, no dia 29 de março.

 

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A cobertura da 11ª Mostra Tiradentes é um projeto do programa Jovens Críticos que busca desenvolver e dar espaço para novos talentos do pensamento cinematográfico brasileiro.

 

A equipe Mnemocine agradece a Universo Produção e a ATTI Comunicação e Ideias pela parceria.

 

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BIOGRAFIA: Felipe Palmieri é estudante de Cinema na FAAP. Absolutamente fascinado por todas as pluralidades e sutilezas que a linguagem cinematográfica é capaz de abrigar, e pelas infinitas perspectivas que foram e serão materializadas através disso.