Vampira Humanista Procura Suicida Voluntário (2023, Ariane Louis-Seize) | 47ª Mostra Internacional de Cinema de São Paulo
Por Giuli Gobbato
Se o gênero do coming-of-age remete a obras que frequentemente se equilibram entre o comum e o clichê, apresentar o gênero de forma distorcida é definitivamente admirável. É isso que alcança Ariane Louis-Seize com sua estreia de longa metragem, Vampira Humanista Procura Suicida Voluntário, que já se apresenta como releitura do gênero no título chocante e direto.
A protagonista Sasha é uma vampira que não consegue matar para se alimentar, pois, diferente de outros vampiros, suas presas não aparecem sem consentimento de sua vítima. Diante disso, a família de Sasha espera o amadurecimento e independência da jovem, quando ela finalmente for capaz de mostrar suas presas e matar sozinha. As características do gênero, porém, não param por aí: a personagem também se envolve com uma possível vítima, Paul, um garoto com tendências suicidas, que encontra na ânsia pela própria morte seu propósito de vida.
A ressurreição da influência dos vampiros na cultura pop é o aspecto mais contemporâneo do filme. Através do cenário vampiresco, Ariane Louis-Seize consegue trabalhar um aspecto-chave do coming-of-age sem cair na mesmice: a identificação universal. Tanto na caracterização da família, quanto dos cenários e na trilha sonora nostálgica dos anos 1960, somos lembrados que o gênero não pode ser considerado batido, já que a experiência da adolescência é comum a todos os espectadores, já vivida ou ainda por vir.
A estranheza desses personagens criada por Ariane Louis-Seize, junto de sua corroteirista, Christine Doyon, dá força ao tom leve do filme. A comédia ganha força através do nonsense, com situações simples beirando o absurdo. Os personagens cedem com naturalidade a vontades banais, tropeçam nos próprios pés e se irritam com lixos jogados na rua, tornando impossível vê-los como ameaçadores. A etiqueta de ser um “ser sobrenatural” é quebrada e o humor surge, então, dessa empatia por criaturas a princípio diferentes de nós, mas que, ou reagem como esperávamos, ou são ainda mais atrapalhados que os humanos.
O título parece resumir a sinopse do filme. No entanto, é apresentado e justificado de forma inversa ao enredo, apenas no final do filme, como ponto de chegada e conclusão da história. Louis-Seize amarra esse olhar fresco sobre o mórbido e o amadurecimento com maestria. E admira-se como a obra vem conquistando as almas do público e da crítica, levando o prêmio de Melhor Direção na Giornate do Festival de Veneza e sendo selecionado para diversos festivais mundo afora.
Biografia:
Giuli Gobbato é cineasta, comunicadora audiovisual e escritora. Formada em Cinema pela Fundação Armando Álvares Penteado (FAAP), sempre explorou o som de todas as formas, inclusive na música. Foi montadora e diretora de som em diversos curta-metragens, além de dirigir e roteirizar dois curtas independentes. Atualmente pesquisa a acessibilidade na comunicação.
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A cobertura do 47º Mostra Internacional de Cinema São Paulo faz parte do programa Jovens Críticos que busca desenvolver e dar espaço para novos talentos do pensamento cinematográfico brasileiro.
Agradecemos a toda a equipe da Assessoria da Mostra por todo o apoio na cobertura do evento.
Equipe Jovens Críticos Mnemocine:
Coordenação e Idealização: Flávio Brito
Produção e Edição: Bruno Dias
Edição: Davi Krasilchik, Luca Scupino, Fernando Oikawa e Gabriela Saragosa
Edição Adjunta e Assistente de Produção: Davi Krasilchik e Rayane Lima